terça-feira, 27 de dezembro de 2011

ARTIGO - POSSIBILIDADE DE REDUÇÃO DO INTERVALO INTRAJORNADA: A GUERRA ENTRE MTE E TST

O intervalo mínimo para repouso e alimentação ainda é tema de muitas reclamações trabalhistas. Em síntese, a CLT prevê, no artigo 71 e parágrafos, que, em se tratando de jornada diária superior a 6 horas, o empregador deverá conceder o mínimo de 1 hora para repouso e alimentação.

Com isso, a jurisprudência maciça veio, ao longo dos anos, consolidando o entendimento de que a supressão do intervalo intrajornada gera ao empregado o direito ao recebimento de 1 hora extra por dia. Tal jurisprudência é o entendimento do parágrafo 4º, do artigo 71 consolidado e traz o entendimento textual:

“Orientação Jurisprudencial 307 SDI – 1. Após a edição da Lei nº 8.923/94, a não-concessão total ou parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, implica o pagamento total do período correspondente, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT).”

Antes disso, o artigo supracitado não possuía este parágrafo, o qual foi introduzido pela Lei nº 8.923/94.

Essa cominação se deve ao fato de que o trabalhador necessita de, no mínimo, 1 hora para alimentar-se e repousar. Isto é, trata-se de medida de higiene, segurança e medicina do trabalho. Diante da norma de ordem pública, inclusive protegida pela constituição federal (art. 7º, XXII), entende-se, por lógica, que o intervalo mínimo é TOTALMENTE PROTEGIDO por nosso ordenamento jurídico.

No entanto, a realidade não é bem assim. Alguns sindicatos vinham convencionando a possibilidade de redução do intervalo intrajornada. Assim, os empregadores representados por tais categorias, suprimiam o intervalo de seus empregados a 30 minutos, diante da previsão convencional e, a partir de então, as reclamações trabalhistas foram ainda mais presentes na Justiça do Trabalho, chegando, por várias vezes, ao TST.

Diante dos reiterados entendimentos das diversas turmas, a corte Superior do Trabalho, em 2009, publicou a Orientação Jurisprudencial nº 342, da SDI – 1, a qual traz o texto:

“I - É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva.

E:

“II - Ante a natureza do serviço e em virtude das condições especiais de trabalho a que são submetidos estritamente os condutores e cobradores de veículos rodoviários, empregados em empresas de transporte público coletivo urbano, é válida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a redução do intervalo intrajornada, desde que garantida a redução da jornada para, no mínimo, sete horas diárias ou quarenta e duas semanais, não prorrogada, mantida a mesma remuneração e concedidos intervalos para descanso menores e fracionados ao final de cada viagem, não descontados da jornada.”

O item I uniformizou o entendimento do TST no sentido de que, cláusulas ou acordos coletivos que prevêem redução do intervalo intrajornada são inválidas, sendo aceitas somente em se tratando de condutores e cobradores de veículos rodoviários, empregados em empresas de transporte público coletivo urbano, desde que atendidas as regras ali constantes.

No entanto, a previsão convencional continuou existindo no âmbito de algumas categorias e, em conseqüência, os trabalhadores continuaram com o intervalo mínimo reduzido.

A OJ do TST esbarrou, por conseguinte, em outra norma Constitucional, a prevista no artigo 7º, XXVI, in verbis:

“reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho.”

Assim foi, no mínimo, constrangedor aos juízes e desembargadores regionais do trabalho decidirem sobre reclamações trabalhistas com tais pleitos, mas, inobstante, ao confrontar uma norma constitucional com uma norma de ordem pública, ligada à higiene, saúde e medicina do trabalho, o constrangimento era facilmente solucionado.

Em abril de 1989, o Ministério do Trabalho e Emprego trouxe mais problemas aos juristas trabalhistas, editando a portaria nº 3.116, a qual previa a possibilidade de redução do intervalo intrajornada, usando das atribuições trazidas no antigo artigo 913 da CLT. Não obstante, em 2007 o mesmo Ministério, com fulcro no §3º, do artigo 71 da CLT, editou a portaria nº 42, revogando a antiga portaria e trazendo nova possibilidade de redução intervalar. Em 2010, veio a portaria 1.095, a qual está em vigor atualmente, também prevendo os requisitos para a redução do intervalo intrajornada, os quais são:

1.    DEFERIMENTO DE AUTORIDADE DO TEM, O QUAL DEPENDE DE:

2.    PREVISÃO DA REDUÇÃO EM ACORDO OU CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO;

3.    EXISTÊNCIA DE REFEITÓRIOS NO LOCAL DE TRABALHO, QUE FORNEÇAM REFEIÇÃO SEM CUSTO OU COM CUSTOS REDUZIDOS AOS EMPREGADOS;

4.    INEXISTÊNCIA DE REGIME DE PRORROGAÇÃO DE HORAS DE TRABALHO;

Ora, vemos, portanto, um confronto entre o executivo e o judiciário, pois, muito embora o Ministério do Trabalho e Emprego aceite a redução intervalar, o TST não aceita.

Assim, fica a dúvida, se a cláusula ou acordo coletivo de trabalho que preveja a possibilidade de redução do intrajornada é inválida (OJ 342 SDI 1, item I), como pode ela ser um requisito para que o MTE autorize a redução?!

Essa “confusão” judicial não é tão somente dos causídicos que atuam no âmbito do direito do trabalho, mas também dos próprios desembargadores e juízes singulares. Os ministros do TST não tem dúvidas: redução é sinônimo de indenização (com caráter salarial), aplicação da sua própria orientação jurisprudencial. Entretanto a justiça laboral regional ainda não uniformizou o entendimento, conforme se verifica nas ementas a seguir do TRT da 2ª Região (SP):

“INTERVALO INTRAJORNADA. SUPRESSÃO PARCIAL AUTORIZADA PELO MINISTÉRIO DO TRABALHO. POSSIBILIDADE. Ainda que inválida a redução do intervalo intrajornada por meio de negociação coletiva de trabalho (OJ 342, da SDI-I, do C. TST), havendo demonstração inequívoca nos autos quanto à autorização de redução por Portaria do Ministério do Trabalho e Emprego, conforme estabelecido no parágrafo 3º, do art. 71, da CLT, descabem as horas extras deferidas decorrentes da inobservância à integral concessão do intervalo pararefeição e descanso, para o período provado. Recurso parcialmente provido.” (TRT 2ª Região. 3ª Turma. Acórdão nº 20111484817. Relator(a): Maria Doralice Novaes. DATA DE PUBLICAÇÃO: 18/11/2011. Disponível em: www.trtsp.jus.br) [Grifei]

Em contrapartida:

“Do intervalo intrajornada. Redução estabelecida em norma coletiva. Invalidade. O Tribunal Superior do Trabalho já fixou o entendimento segundo o qual a norma que disciplina o intervalo diz respeito à higiene, à saúde e à segurança do trabalho, razão pela qual não pode ser afastada pela via da negociação coletiva. OJ 342 da SBDI-1. Recurso do empregado a que se dá provimento, para o deferimento, como extra, da hora correspondente.” (TRT 2ª Região. 10ª Turma. Acórdão nº: 20111464522. Relator(a): Marta Casadei Momezzo. DATA DA PUBLICAÇÃO: 14/11/2011. Disponível em: www.trtsp.jus.br) [Grifei]

Observe-se que ambas as ementas são recentes, com diferença de publicação de apenas 04 dias, mesmo assim totalmente contrárias. Assim, verifica-se a ausência de uniformização de entendimento jurisprudencial dos regionais, pois, de um lado a corte superior prevê a invalidade de cláusula de convenção ou acordo coletivo prevendo redução, por outro, o próprio Ministério do Trabalho e Emprego possui competência e, nos casos de requisitos preenchidos, autoriza a redução.

Importante salientar, outrossim, no aspecto processual, que, em se tratando de um advogado, por parte da empresa que reduz o intervalo com autorização ministerial, talvez não seja tão interessante a interposição de recurso de revista, pois há entendimento cristalizado no TST e, em se tratando de causídico por parte de reclamante, no caso do primeiro acórdão, ele simplesmente DEVE levar o caso à Corte Superior, também pelo entendimento pacífico ser a seu favor.

O curioso, outrossim, é que o TST vem denegando conhecimento a recursos de revista interpostos por empresas com autorização ministerial, sob o entendimento de que a violação de portaria do MTE não possui condão de ensejar a revista.

Pessoalmente, independentemente do caráter protetivo ao empregado, entendo haver uma necessidade do Tribunal se adequar e modificar o item I, da OJ 342, da SDI-1, pois, além da portaria do MTE, há a previsão legal, contida no §3º, do artigo 71 consolidado.

No que tange a divergência jurisprudencial apontada no TRT 2ª Região, suscitei, há pouco, incidente de uniformização de jurisprudência, de modo a que o Tribunal redija súmula regional neste sentido.


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