sábado, 4 de fevereiro de 2012

ARTIGO: TRABALHO A DISTÂNCIA E SUPOSTA ALTERAÇÃO DA SÚMULA 428 DO TST

A mais recente discussão dentre os juristas que atuam no direito e processo do trabalho é alteração na CLT trazida pela Lei nº 12.551/2011, a qual equipara os serviços realizados no domicílio do empregado ao realizado na sede do empregador, bem como a provável alteração da súmula 428 do TST.

Entretanto, a lei supra veio, digamos, chover no molhado, senão veja-se.

Antes dessa lei, o artigo 6º, da CLT não tinha parágrafos, mas trazia o seguinte texto:

“Art. 6º. Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado, desde que esteja caracterizada a relação de emprego.” [Grifei]

Para tanto, analisem-se quais são os requisitos para configuração de relação de emprego, memorizando a palavra SHOP:

·       Subordinação;

·       Habitualidade;

·       Onerosidade;

·       Pessoalidade.

Agora, tem-se de avaliar o texto trazido pela Lei nº 12.551/2011, o qual altera o acima transcrito, in verbis:

Art. 6o Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.

Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.” [Grifei]

Muita gente pode imaginar que, bem, trouxe muita alteração, é bem diferente, traz a inserção do trabalho realizado à distância, bem como os meios informatizados.

Todavia, a título prático, isso já existia. Estando caracterizada a relação de emprego, ou seja, estando presentes os pressupostos SHOP, não haveria, antes da Lei 12.551/11, distinção de qualquer forma. O empregado poderia realizar o trabalho no Acre, com o empregador no Paraná, que não se distinguiria. De outra forma, o trabalhador poderia prestar serviços na sede da empresa e não preencher um ou mais requisitos da relação de emprego que esta não estaria caracterizada.

Além disso, o trabalho realizado no domicílio do empregado pressupõe que seja realizado a distância.

Este entendimento já existia muito tempo antes, conforme se verifica nos julgados a seguir:

“TRABALHO EM DOMICÍLIO. COSTURA. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. O fato de desenvolver-se a atividade laborativa FORA DO ÂMBITO DA EMPRESA, mais precisamente NO DOMICÍLIO DO AUTOR não constitui óbice à incidência do aparato protetivo consolidado. Isto porque a lei (art.6º, CLT) não distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e aquele executado no domicílio do empregado, para fins de formação do vínculo empregatício. SENDO IRRELEVANTE O LOCUS DA PRESTAÇÃO LABORAL, é de se concluir que não existe incompatibilidade legal ou lógica entre contrato de emprego e a atividade de costura em domicílio, mormente na situação dos autos, em que a apropriação da força de trabalho foi feita por empresa devotada ao ramo de confecção (bichos de pelúcia), que tomou os serviços pessoais dos trabalhadores, forneceu-lhes máquinas de trabalho, engajou-os na atividade-fim, submeteu-os ao seu poder diretivo, fixou o valor a ser pago, definiu os padrões de produção e fiscalizou o desempenho do trabalho. Quase sempre o trabalho em domicílio tem por características: a) a prestação não eventual do serviço no domicílio do trabalhador ou em local de sua escolha; b) fornecimento de maquinário, matérias-primas, moldes e tamanhos, pelo tomador; c) subordinação jurídica que se manifesta pela fiscalização ou supervisão do processo produtivo e do produto realizado, com outorga de rol de instruções técnicas, fixação de padrões de quantidade, qualidade, modelos, prazo de entrega etc; d) estipulação de preços pelo tomador, por tipo de peça, metragem etc. A OIT tem incentivado o home job, e, conceitua como trabalho em domicílio "...o labor em que uma pessoa, mediante remuneração, realiza em seu domicílio ou em outros locais de sua livre escolha, distintos dos locais de trabalho determinados pelo empregador para elaborar um produto ou prestar um serviço de acordo com as especificações do empregador, independentemente de quem proporcione os equipamentos, materiais e elementos utilizados para tanto" (Alexandre Agra Belmonte). Sem prova da alegada autonomia (ônus da reclamada, art. 333, II, CPC), e presentes elementos indicativos de pessoalidade, continuidade, onerosidade e subordinação, dá-se provimento ao apelo para reconhecer o vínculo de emprego.” (TRT 2ª Região. 4ª Turma. ACÓRDÃO Nº: 20090838577. RELATOR(A): RICARDO ARTUR COSTA E TRIGUEIROS. Publicado em 09/10/2009) [Grifei]

E:

“VÍNCULO JURÍDICO DE EMPREGO. TRABALHO A DOMICÍLIO. O artigo 6º da CLT ampara o trabalhador doméstico à comparação ao empregado que desenvolva atividades no interior da empresa. Caso em que a subordinação deve ser compreendida de forma elastecida, considerando-se a particularidade da situação. Vínculo jurídico de emprego reconhecido. Recurso Provido.” (TRT 4ª Região. 6ª Turma. Acórdão do processo nº: 0141500-40.2009.5.04.0022. RELATOR(A): JOSÉ CESÁRIO FIGUEIREDO TEIXEIRA. Publicado em: 23/03/2011) [Grifei]

E ainda:

“EMPREGADO A DOMICÍLIO - VÍNCULO DE EMPREGO - Dispõe o art. 6º/CLT não haver distinção entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e aquele executado no domicílio do empregado, DESDE QUE ESTEJA CARACTERIZADA A RELAÇÃO DE EMPREGO, sendo certo que o art. 83/CLT assegura o direito ao salário mínimo ao trabalhador em domicílio. ASSIM, PRESENTES OS REQUISITOS DITADOS PELO ART. 3º/CLT, CONSISTENTES NA PESSOALIDADE, ONEROSIDADE, NÃO EVENTUALIDADE E SUBORDINAÇÃO JURÍDICA, impõe-se manter a r. sentença que reconheceu o vínculo empregatício e assegurou o direito a remuneração equivalente ao mínimo legal.” (TRT 3ª Região. 10ª Turma. Processo nº: 00923-2008-101-03-00-5. Relator(a): Maria Cecília Alves Pinto. Publicado em: 25/11/2009) [Grifei]

Assim, vêem-se três de muitos julgados neste sentido, de regionais diversos e com datas anteriores à Lei 12.551/2011.

Importante verificar, ainda, o que a doutrina traz, como a renomada jurista Alice Monteiro de Barros ensina:

“A subordinação jurídica do trabalhador a domicílio não é substancialmente diversa da subordinação do empregador que exerce suas atividades no interior da empresa. Em ambas as situações, a subordinação tem como substrato a livre manifestação volitiva das partes, isto é, tem base contratual, sendo, portanto, compatível com os princípios da igualdade e da liberdade. A subordinação constitui, portanto, uma situação jurídica que possui graus diversos, apresentando-se menos intensa no trabalho a domicílio, que se desenvolve longe dos olhos do empregador. No trabalho a domicílio, descentraliza-se o processo produtivo, uma vez que o objeto da prestação do trabalhador vem em destaque não como resultado, mas como energia laborativa utilizada em função complementar e substitutiva do trabalho executado no interior da empresa. Em consequência, o vínculo de subordinação consiste na inserção da atividade do prestador no ciclo produtivo empresarial e na observância a ordens preventivas e sucessivas. Ainda que operando externamente e com seus próprios meios e instrumentos de trabalho, o trabalhador torna-se elemento integrativo”. (In: Curso de Direito do Trabalho. 5 ed. São Paulo: LTR Editora, 2009. p. 322-3) [Grifei]

Visto isso, ou seja, a unanimidade de entendimento de que o trabalho a distância poderia ser caracterizado antes da lei do trabalho a distância, resta analisar os meios telemáticos ou informatizados.

Ora, se o trabalho é realizado a distância, por óbvio que NÃO SERÁ PRESENCIALMENTE QUE A SUBORDINAÇÃO SE DARÁ. Isto é, em havendo a relação de emprego a distância, devidamente caracterizada consoante viu-se ser possível, é de clara apreciação que a subordinação e controle se dará mediante um meio informatizado ou telemático.

Implica, então, demonstrar um exemplo de como se caracterizaria a subordinação ou prestação de serviços por estes meios. Suponha-se um contador que, contratado para prestar seus serviços a uma empresa com essa atividade-fim, mas com a condição de ser o serviço realizado em seu domicílio, realize os balancetes, cálculos, lançamentos tributários e emissão de guias de sua residência e envie, todos os dias, tais serviços ao empregador, por e-mail, meio este utilizado pelo próprio empregador para enviar as ordens de serviços. Está, portanto, caracterizada a relação de emprego.

Até então, discutiu-se somente o direito material. Não há contraditório nem instrução.

Com esta base, muitas reclamações trabalhistas pleiteavam o dito “sobreaviso”, ou seja, o período no qual o empregado ficava fora da jornada de trabalho esperando ordens do empregador, resultando em horas de sobreaviso, como se à disposição estivesse.

Alguns reclamantes sim, estavam em sobreaviso, com a adoção, pelo empregador, de celulares, rádios, pageres etc. Entretanto aproveitavam a situação do PORTE de um desses meios para protestar por tais horas, sem que efetivamente estivessem à disposição do empregador.

Diante disso, em 31/05/2011, o Tribunal Superior do Trabalho publicou a súmula 428 (outrora uma orientação jurisprudencial), a qual traz:

“SOBREAVISO. O uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de BIP, “pager” ou aparelho celular, pelo empregado, POR SI SÓ, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço.” [Grifei]

Bem, conclui-se, portanto, que o enunciado fala mais sobre a prova do regime de sobreaviso e não do direito material. É um claro engano imaginar que o TST suprimiu direitos com a edição desta súmula, pois o cerne, a intenção, foi justamente descaracterizar o simples porte de aparelho de comunicação como suficiente para caracterizar a existência dos requisitos de relação de emprego.

Em suma, significa dizer que o uso desses aparelhos é só uma das provas para o sobreaviso, devendo existir outras que demonstrem a efetiva espera por ordens do empregador.

Diante do vigor da Lei 12.551/2011, o TST já divulgou notícias sobre alteração desta súmula. Fato este que causou grande alvoroço dentre os juristas. Alguns textos noticiados vieram com os dizeres: (a lei veio) com entendimento contrário ao que dispôs a súmula do TST.

É, no mínimo, de causar estranheza tais considerações, pois a lei, em nenhum momento, é contrária ao entendimento sumulado. Como já exposto: A SÚMULA 428 DO TST ENTENDE QUE O MERO, O SIMPLES USO DOS APARELHOS NÃO SIGNIFICA QUE O EMPREGADO ESTEJA DE SOBREAVISO.

Portanto, o que juristas esperam é um desfecho lógico e sensato da Corte Máxima do Trabalho, restando tão somente aguardar os próximos capítulos, mas sempre de “sobreaviso”, atentos às novidades.